Por Carlos Sherman
Gestão é fazer bem as coisas.
Liderança é fazer apenas o que deve ser feito.
Peter Drucker
Essential Drucker
O maior inimigo do conhecimento não é a ignorância, mas a ilusão do conhecimento.
Stephen Hawking
Hoje sei: a Administração essa é uma das ciências mais fascinantes que existe. Talvez seja mais bem descrita como uma arte, e que naturalmente deve basear-se em conhecimento… como qualquer outro empreendimento humano. E qualquer tentativa de fechar este tema está fadada ao fracasso! Esse é um processo aberto em campo aberto. E esse é um processo multidisciplinar, cujo alcance abrange toda atividade humana.
Isso não implica um convite à generalização, e muito menos ao nonsense, e ao contrário – como procurei demonstrar em nosso curso. Precisaremos de mais ciência, mais conhecimento fundamentado, no convívio com a complexidade emergente e inerente ao próprio processo inteligente, de processamento da informação; e como contraponto à desordem e o caos inerente ao destino do universo, da terra, da vida e do homem – rumo à extinção.
Em suma, insisto que vivemos em ilhas de ordem, e organizados de forma cada vez mais complexa, e lutando para sobreviver como espécie. Sendo esse é um processo contínuo, incessante, contingente, e onde mais vale – como ressaltado na primeira aula – exercitar a pensabilidade… e estar em plena forma para o convívio diário como organização, e atenção aos clientes. Esse exercício contínuo pode contribuir com a plenitude de nossas vidas e relações, em caráter privado, e que realimentará de significado a nossa contribuição laboral e cidadã. Pois, ousai saber!
Podemos abordar a complexidade nas organizações de muitas formas, e tantas quanto a criatividade permita… e, como dito, esse é definitivamente um tema multidisciplinar. Mas nenhuma das alternativas que violem leis físicas, químicas, biológicas, merecem o nosso tempo e atenção, em uma vida claramente finita, em um tempo finito, e onde a realidade subjacente e onipresente nos apresentará a conta no final de cada dia: Cui bono?
É bem evidente que a simplicidade desapareceu, e não devemos apostar no seu retorno em nossos dias… Mas o simplismo tem reaparecido em teorias gerais, e como uma espécie de criação de sentido retrospectivo; e denotando hiperbólica e obviamente que a precisão está em xeque. E mesmo sendo este um fato, não avançaremos retrocedendo; mas confrontando a desordem provocada pelos grandes números, e fustigando a acuracidade de nossa coleta, orquestração e análise de dados.
Sistemas são compostos por partes autônomas e relações, nodes and links (e não encontrei tradução à altura); e a complexidade dos sistemas pode ser definida como uma resultante não-linear quantitativa das partes autônomas, e qualitativa de suas relações. Lato sensu, podemos dizer que um sistema é, portanto, um processo que incluí coisas e relações. E isso emerge da maneira como a nossa própria cognição aborda a realidade e seus desafios. Nós pensamos assim. Portanto, sistemas são também modelos mentais que teorizam as relações entre mais de uma unidade autônoma.
Quando nos unimos em torno de algum propósito tangível, será necessário estabelecer alguns padrões e referências, e que nos permitam certo grau de liberdade, mas remando na mesma direção. E aproveito o exemplo do remo olímpico: um sistema simples, com regras claras, e barcos estandardizados com 2 ou 4 remadores, com ou sem timoneiros; ou com 8 atletas e um timoneiro; onde as partes autônomas estão claras, assim como seus papéis e links. O objetivo desta organização é claro, cruzar a linha de chegada no menor tempo possível; o que inclui manter o barco em linha reta – sendo esse o menor caminho entre a largada e a chegada. E o timoneiro? Bem, esse cara tem um papel importante, mas que não é indispensável em sistemas mais simples, com 2 ou 4 remadores. Mas na modalidade com 8 remadores, o timoneiro torna-se essencial. Por quê? Pelo risco inerente à desordem, em função do incremento das partes autônomas envolvidas.
Portando, regras permitem a ordem. Ordem, permite sentido. Número demanda conciliação. Conciliação demanda progresso, pela convergência. Gosto do conceito de ordem e progresso estampado em nossa bandeira pátria; muito embora a entropia que assole o nosso país – igualmente distribuída por todo universo – encontre oportunidades históricas amiúde para exibir um mostruário representativo da diversidade humana no capítulo “psicopatologias”.
Fatos, conhecimento, diagnósticos de personalidade, e cultura, podem não ser suficientes para grandes logros em transformação; mas grandes logros sempre demandarão grandes fatos, conhecimento, diagnóstico de recursos humanos e cultura. E mesmo um imperador psicótico estará sensível aos fatos que comprometem seu reinado. Mesmo aqueles que chegaram ao sucesso por uma via acidental, estarão sensíveis à fatos que demonstrem sua vulnerabilidade sob outras condições. E mesmo que ditas personalidades não alcancem a humildade necessária diante dos fatos, e isso é bem provável, não serão reverências que garantirão um bom trabalho de nosso time. E se a manutenção de um cliente depende de genuflexão, então estamos diante de uma situação bem vulnerável e transitória. Sempre lembrando quanto mais altos na hierarquia, menos dispostos à contestação. E é por isso mesmo que as gerências médias farão o trabalho, porque continuam aprendendo.
Vale ressaltar, antes de seguir, que complexidade é diferente de desordem. A ordem em sistemas equivale à convergência entre partes autônomas, aceitando regres relacionais e papéis funcionais. Precisamos conhecer os objetivos, e estamos juntos em respeito à algum tipo de significado que partilhamos, enquanto unidades autônomas. A complexidade pode refletir a demografia de um sistema, a natureza de seus objetivos, ou as duas coisas. O objetivo pode descortinar a próxima descoberta científica… e não será possível sem pertencer à um sistema de conhecimento, e povoar uma organização. Mesmo como investigador independente. O objetivo pode ser tecnológico, e também demandará um esforço orquestrado. Podemos estar envolvidos na fabricação de produtos para comercialização. Ou pretender a comercialização de serviços.
Aqui, estamos no estado da arte na arte de organizar pessoas em torno de um significado. Não são apenas os gestores que estão perdidos… Estamos impulsionando as fronteiras e avançando sobre a entropia… e não impunemente. Assim, e com a máxima de Bill Gates em riste, quero saber daqueles que fizeram as mesmas perguntas que faço. Quero saber daqueles que formularam questões melhores do que as minhas. E possuo um acervo de conhecimento bem fundamentado, e a atitude da pensabilidade, como um sistema imunológico contra ideologias especiosas. Resultado de uma busca obstinada por contribuir, e encontrar caminhos mais confiáveis.
Livres, e pela expressão individual automática, autônoma, alicerçada por nosso gabarito genético e comportamental, arbitraremos naturalmente tantos modelos mentais quanto a combinatória neuropsicológica e linguística permita. Mas isso não constitui uma organização. Mesmo quando teorizamos sobre um sistema composto por duas partes autônomas, essa triangulação simples entre observador e sistema observado, será muito difícil, já que demandará um sistema de conhecimento para teorizar sobre o observador. E a neurociência é a resposta à essa digressão.
Estive envolvido na disputa entre três departamentos de uma grande organização dedicada ao agronegócio, na tentativa de conciliar o que convencionamos chamar de “KPIs SUSTENTÁVEIS”. Os três grupos “autônomos”, que conciliavam os interesses de suas pastas, pensavam em suas bonificações. De forma simplificada, pretendíamos modificar o processo para diminuir a agressão ao meio ambiente. Isso criava impactos de curto prazo nos KPIs de cada área, gastaríamos um pouco mais para “fazer o que era certo”, o que afetava resultados financeiros, industriais e agrícolas. Somente Vendas e Marketing exultavam, em função de demandas mercadológicas, selos de qualidade, e que impulsionariam os negócios.
Além disso, a holding congregava 5 unidades com elevado grau de autonomia, mesmos que regidas pelos menos objetos sociais e finalidades fabris. Somemos a isso a diversidade humana apoderada, a personalidade dos C-level, dos stakeholders, e a natureza societária. E esse é o dilema do pacifista: quem vai abaixar as armas primeiro? Precisávamos conciliar os interesses dos conciliadores em cada empresa do grupo, e em cada área, e não havia consenso sequer no âmbito corporativo.
Primeiro, houve uma consulta mais ampla, e foi muito difícil encontrar o caminho do diálogo. Não decidimos bem em assembleias… e pensem bem nisso. E isso tem razões evolucionárias, consagradas em nossa filogenética, e impressas em nosso sistema neural. Ainda somos tribais… mesmo que não esteja aparente aos olhos do senso comum. Esse entendimento me permitiu argumentar em favor de reduzir uma assembleia de quase 60 gerentes, diretores, e corporativo, a 8 interlocutores. Isso demonstrou expôs enormes dificuldades em liderança, e na qualidade das relações deste grupo.
De forma geral, os corporativos não eram capazes de conciliar os interesses de suas pastas, nem demonstravam clareza em termos de objetivos, políticas, metodologias e métricas, em seu âmbito de autonomia… e onde devem aportar algum valor. Sendo possível evidenciar a questão. Por outro lado, encontramos dois diretores de unidades autônomas que precisavam ser mais bem avaliados. E neste ponto, procedemos avaliações pessoais, e utilizando ferramentas psicométricas disponíveis à época. E avançamos muito neste sentido, e encontramos hoje muitas ferramentas psicométricas analítica para o perfil neuropsicológico, com abordagens emocionais, intelectuais, lógicas, condicionais, sociais e éticas. Mas também estamos avançando em estabelecer o perfil cultural das organizações.
No caso em questão, logramos definir KPIs sustentáveis. Tratei de envolver os stakeholders no debate, demonstramos que as projeções em termos de participação no mercado promoveriam a recuperação e incremento nas bonificações. Mas trabalhamos também a consciência coletiva, social, e ética… a despeito da variabilidade humana. Até mesmo os psicopatas podem disfarçar um recuo, vez ou outra. Mas quando mapeamos um parasita clássico, não devemos tolerar sua permanência… a menos que a companhia também pretenda parasitar outros organismos. E neste caso tempos uma cultura mapeada… e este tipo de organização não pretenderá a verdade, nem o melhoramento contínuo de forma sustentável.
Logramos as certificações de qualidade necessárias, o tempo revelou que todos ganharam. O dilema do pacifista foi encenado, discutido, entendido, e posso dizer que Hobbes pode e deve ser questionado. E uma grande lição neste processo virtuoso foi a constatação empírica de um modelo de positivo, onde a soma não precisa ser zero. E todos ganharam porque tomamos uma decisão alicerçada por conceitos claros, conhecimento e fatos. Mas sabemos que as estórias não costumam terminar assim no mundo corporativo, e posso ter romantizado um pouco… Mas sem dúvida este é o norte, ações positivas e realismo.
Quando operamos no setor público e privado, e operamos no Brasil, operamos em no layer complexo da gestão em grandes empresas e instituições – o que demanda investigação contínua. Não encontraremos soluções prontas, e esse é um processo. Esse é o rol do “cognitive edge” – ou vantagem cognitiva -, e induz uma nova e curiosa função nas empresas, e cada vez mais frequente nas organizações modernas: o CSO – ou Chief Scientific Officer. Essa também é a essência do conceito de Think Tank, em voga nos círculos públicos e governamentais, mas que estreia em todas as grandes consultorias em gestão, como tendência.
O nosso maior ativo em qualquer organização, presumo, é a pensabilidade; e o insumo para este exercício é a pensabilidade de nossos colaboradores, as unidades autônomas dentro da organização. Mas autonomia não presume liberdade infinita, e sim liberdade conciliada por senso de propósito organizacional.
Mas qual é a importâncias de estarmos organizados? Qual é a importância da ordem para o progresso? Uma boa provocação e um frequente porto de partida para investigações no âmbito organizacional é a “hipótese do mundo vazio” de Herbert Simon, alegando que estamos “fracamente conectados” (p. 111). Mas este tipo de teorização implora refinamento, já que transcendemos ao status de hiperconectados… and beyond. Talvez muito de nossa realidade persista em um “mundo vazio”, mas não será assim por muito tempo; e não é assim no mundo das organizações produtivas e que geram valor.
Outro porto de partida exploratório na investigação organizacional é procurar por loops amplificadores e neutralizadores de desvio. E isso encontra analogia com os circuitos neurais. De forma superficial, loops neutralizantes de desvios servem à organização e à ordem, enquanto os loops amplificadores desorganizam e promovem desvios em favor da anomia e da entropia. E esta atitude defensiva também encontra analogia com o comportamento humano, já que possuímos 70% de nosso gabarito emocional voltado à mitigação dos falsos positivos, enquanto apenas 30% de nossas emoções estão orientadas ao otimismo, e com o possível incremento de falsos positivos. Isso poderia ser letal no Pleistoceno, mas não em um estado e um mundo judicializado.
Não podemos abaixar a guarda por completo, muito menos efetuar uma reformulação vertical em nossa natureza, mas o movimento neuropsicológico dito positivos, capitaneado por Seligman, vêm ganhando força na cena organizacional; sugerindo que foquemos em valorizar o que é positivo, e não em nos defender do que é daninho. Tenho algumas ressalvas a respeito, e principalmente por saber que psicopatas escalam o topo das hierarquias públicas e privadas, além das constatações sobre os caminhos percorridos pela seleção natural em favor de nossa tendência neurótica. Mas os nossos ancestrais viviam um cenário bem distinto. Assim que, também aposto da virtude, na neuropsicologia cognitiva positiva, mas incentivando a descentralização e a limitação do apoderamento.
Também recomendo a contínua formação de nosso grupo em termos de pensabilidade, como dito, mas desta vez para confrontar o medo e o assombro em nossos genes, como referências comparativas baseadas em fatos e evidências. Em geral, tememos o que desconhecêssemos. Por isso precisamos medir e entender.
A Segunda Lei da Termodinâmica é a Primeira Lei da Neurociência Cognitiva. Somos desafiados diariamente pela desordem, e precisaremos aprofundar o entendimento sobre isso, sobre a Física, Química, e a Biologia, e sobre nosso aparato cognitivo, para assegurar a nossa sobrevivência, de nossos entes queridos e de nossa espécie. Não viveremos para sempre, mas poderemos tornar nossas vidas mais produtivas, e contribuir em um legado maior, e que assegure uma cota de decréscimo em desordem, mitigando riscos, e tornando a vida mais saudável.
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